Já há sinais de que o Aedes aegypti está se espalhando pelo mundo e colocando em risco novas populações humanas, de acordo com um artigo científico publicado nesta quinta-feira (24), na revista Science. O autor do artigo, Jeffrey Powell, biólogo evolutivo da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, afirma também que duas subespécies do mosquito já convivem em áreas geográficas sobrepostas e estão gerando híbridos – o que pode expandir o alcance das doenças transmitidas pelo inseto.
O mosquito tem duas subespécies. O Aedes aegypti aegypti (AAA), a subespécie que existe no Brasil, historicamente só era encontrada ao longo do ano todo em regiões tropicais e subtropicais fora da África. Por preferir o sangue humano e consequentemente ter se adaptado às áreas urbanas, o AAA transmite doenças como dengue, chikungunya e zika. A outra subespécie, o Aedes aegypti formosus (AAF), que historicamente vivia apenas em florestas da África, alimenta-se preferencialmente do sangue de animais e por isso é considerado inofensivo para humanos.
De acordo com Powell, no entanto, as duas subespécies começaram a se sobrepor em certas áreas da África e, em algumas delas, já estão produzido híbridos. “Claramente, a simples dicotomia dos dois subtipos distintos de Aedes aegypti foi demolida. Suas distribuições geográficas estão começando a se sobrepor e eles estão se hibridizando. Ecologicamente, eles não podem mais ser claramente separados”, explicou Powell.
Além disso, o AAA já começa a aparecer durante todo o ano em locais que até agora estavam livres do mosquito, como a Ilha da Madeira, o Mar Negro e áreas das costas oeste e leste dos Estados Unidos como a Califórnia e Washington D.C.
“Essa expansão está colocando em risco grandes populações humanas que não estavam habituadas ao contato com os vírus espalhados pelo AAA e não têm defesas imunológicas contra eles. Isso aumenta imensamente a probabilidade de epidemias severas. A distribuição do Aedes aegypti está em um estágio de fluxo e provavelmente continuará a se expandir, à medida que o movimento de pessoas e mercadorias aumenta e as mudanças climáticas alteram os ecossistemas”, disse Powell.
Segundo ele, por causa dos hábitats e comportamentos muito distintos, as duas subespécies historicamente apresentam riscos diferentes à saúde. “O AAF é relativamente benigno, encontrado em florestas com baixa densidade humana e preferindo o sangue de animais. Por adorar o sangue humano, o AAA tem sido responsável pela maior parte das doenças transmitidas por essa espécie. A distribuição das duas subespécies é por isso de importância considerável”, afirmou o cientista.
Êxodo florestal
Além da hibridização com o AAA, na África subsaariana, os mosquitos considerados geneticamente e morfologicamente pertencentes à subespécie AAF agora estão vivendo em hábitats urbanos, incluindo cidades como Dacar (Senegal), Yaoundé (Camarões), Luanda (Angola) e Libreville (Gabão).
“Isso foi provavelmente decorrência de uma resposta à expansão dos centros urbanos africanos sobre as florestas onde vivem os mosquitos AAF. O habitat das larvas mudou de buracos em árvores para locais como pneus e vasos, indicando que as fêmeas mudaram seu comportamento de postura de ovos”, declarou.
Powell explicou ainda que o AAF, nativo da África, é a subespécie mais antiga do Aedes aegypti. “Uma forma domesticada, o AAA, evoluiu a partir desse ancestral silvícola, possivelmente como resposta à expansão do deserto do Saara, entre 4 mil e 6 mil anos atrás”. Segundo Powell, o AAF é todo preto, enquanto o AAA é marrom escuro, com listras brancas no abdome.