A Bela e a Fera pode ter sido inspirada em uma história real, sabia?

Rodrigo Casarin

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Pedro Gonzáles nasceu em 1537, no arquipélago de Canárias, na Espanha, com uma doença chamada hipertricose, mais conhecida como “síndrome do lobisomem”. Seus pelos cresciam abundantemente por todo o corpo, exceto nas palmas das mãos e solas dos pés. Sua aparência fez com que fosse isolado do convívio social e tratado como um bicho. Aos dez anos, seu pai lhe deu de presente para Carlos V, imperador do Sacro Império Romano-Germânico – era um capricho dos mandatários da época “colecionarem” criaturas de terras distantes.

Depois da corte de Carlos V sofrer um ataque, Pedro foi parar nas mãos de Henrique II, então rei da França, que resolveu tentar humanizar aquele ser peludo. Rebatizou-o como Petrus Gonsalvus, colocou-lhe roupas nobres e mandou que lhes dessem estudo. Contrariando as expectativas dos entendidos da época, Petrus aprendeu a ler, escrever e falar algumas línguas. Após a morte de Henrique, Petrus passou para as mãos de Catarina de Médici, que decidiu dar-lhe a mão de uma bela. Sim, como você já deve estar imaginando, a moça escolhida se assustou quando descobriu quem seria o seu marido, no entanto, “com o tempo, o susto inicial da noiva parece ter dado lugar a uma relação amorosa e a um casamento bem-sucedido”.

arte_ABelaEAFeraO registro histórico está no texto de introdução, assinado pelo escritor Rodrigo Lacerda, do livro “A Bela e a Fera”, recém-lançado pela Zahar. O volume reúne duas versões para a narrativa que teria sido inspirada na vida de Pedro Gonzáles: a clássica, assinada por Madame de Beaumont, de 1756, e a original, de Madame de Villeneuve, publicada em 1740. O título, que conta com tradução de André Telles, ainda apresenta diversas ilustrações coloridas assinadas por Walter Crane – como as que ilustram este post -, inglês que viveu entre a segunda metade do século 19 e o começo do século 20.

Se toda a sorte de adaptações da história, inclusive o novo filme que a Disney lançará em 2017, costumam partir do trabalho de Beaumont, é no texto de Villeneuve que encontramos uma versão escrita mais detalhada de “A Bela e a Fera”. Nela, dentre outras coisas, conhecemos o passado dos personagens principais – a Fera tomaria a aparência horripilante após ser enfeitiçado por uma fada malvada, por exemplo.

“Das duas versões de ‘A Bela e a Fera’ aqui reunidas, a de Madame de Beaumont é curta, no formato mais usual dos contos de fadas que conhecemos, enquanto a de Madame de Villeneuve é bem mais longa, chegando ao tamanho de um romance. A de Beaumont é dirigida às crianças e suas professoras/preceptoras, a de Villeneuve é nitidamente voltada para o público adulto. Beaumont cortou muita coisa não essencial da versão que a precedeu, eliminando personagens e reduzindo a história a uma estrutura arquetípica. Eliminou várias subtramas criadas por Villeneuve, por exemplo os antecedentes da situação dramática principal, como as histórias pregressas da Fera e da Bela. Nas duas versões, porém, o cenário urbano na abertura da história chama atenção, pois é pouco usual em contos de fadas, bem como a condição social dos personagens, que não são nem reis nem camponeses”, enumera Lacerda.

O escritor ainda lembra que, segundo críticos, a ênfase da história seria diferente entre as versões. “Enquanto Villeneuve daria maior importância ao processo de humanização vivido pela Fera, Beaumont daria maior importância ao esforço de Bela para se abrir ao diferente em nome da virtude”.

Veja outras duas ilustrações de Walter Crane para “A Bela e a Fera”:

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